Carcharhinidae é o nome de uma família. No caso, trata-se de uma família de eméritos tubarões muito conhecida. Entre os elementos mais famosos desta família, temos o Prionace glauca e o Galeocerdo cuvieri ou, mais simplesmente, a tintureira e o tubarão-tigre, respetivamente. Outros tubarões, também famosos, como o tubarão-branco ou o rinquim, não fazem parte desta família, mas sim da Lamnidae. Claro que estamos a falar de famílias taxonómicas (científicas) e não de famílias de sangue, como fazemos entre humanos.
Voltando à nossa família, a Carcharhinidae. Em 1988 apareceram alguns tubarões pertencentes a esta família nos ilhéus das Formigas. Foi no dia 17 de Julho, mais precisamente, que pescadores capturaram alguns animais e suscitaram a curiosidade da comunidade científica. Em 1995, o técnico da Universidade dosAçores, João Brum, em conjunto com o Professor José Azevedo, publicaram um artigo científico que clarificou a identificação dos animais e assim deu uma nova espécie aos Açores: os Carcharhinusgalapagensis ou, como são conhecidos entre os amantes do mar, os tubarões-das-Galápagos.
Claro, como é habitual, os cientistas não se contentando com uma resposta, lançaram imediatamente mais umas quantas perguntas: Como é que estes tubarões conseguiram chegar das Galápagos até aqui? Porquê apenas agora? Ir-se-ão conseguir estabelecer? Irão ameaçar as populações de presas ou competidores? Porque aparecem nas Formigas e não em qualquer outro local dos Açores? Aparentemente, algumas destas novas perguntas começam a ter também resposta.
É senso comum que estes tubarões tenham conseguido chegar até aos Açores com a abertura do Canal do Panamá. Esta resposta explicaria também a segunda questão. Apesar de não haver provas, parece tão evidente que esta resposta não tem suscitado o devido debate. Eventualmente, devia ser debatida porque a densidade nalguns pontos do Atlântico é tão elevada que não faz sentido o povoamento apenas ter sido iniciado em 1914. Esta técnica de eliminar hipóteses concorrentes pela simplicidade e lógica da resposta obtida tem um nome. Chama-se Navalha de Occam (ou Lei da Parcimónia) e postula simplificadamente que “a resposta menos complexa costuma ser a correcta”.
Quanto ao estabelecimento da população, a questão é bem mais complicada. Eu já mergulhei muitas vezes nos ilhéus das Formigas, no Recife Dollabarat e no Banco do Entre-Meio (as três áreas acessíveis da Reserva Natural das Formigas). No entanto, por apenas duas vezes consegui ver estes animais debaixo de água. Isso, pensava eu, indiciava que a população não era muito robusta. Numa dessas duas vezes consegui ver cinco tubarões em simultâneo! Para além do entusiasmo e emoção, tenho de admitir que também houve algum “respeito”…
Ao longo dos anos, tenho advogado a proteção efetiva dos ilhéus das Formigas. Enquanto tive responsabilidades pela matéria, ajudei a implementar regras mais restritivas de utilização e incentivei o incremento da sua fiscalização. Apesar disso, mesmo eu, sempre duvidei da sua eficiência. Portanto, imaginem a minha alegria quando, este ano, um dos responsáveis por uma empresa de mergulho turístico comescafandro autónomo de Santa Maria, o Paulo Reis (*), me relatou que na época de 2013 viram tubarões-das-Galápagos em quase todos os mergulhos. Num deles, viram mesmo 12 animais diferentes! Para além de espetacular, é mais um indício de que a Reserva está a ser respeitada. É um assunto a seguir com atenção e, aparentemente, responde à dúvida sobre a manutenção da população de tubarões.
Quanto a ameaçar outras espécies… pode estar a acontecer, mas não se nota nada. A última vez que mergulhei nas Formigas, vi tanta vida e tão animada que me custa a crer que estes tubarões estejam a prejudicar a fauna local. No entanto, sou de opinião que este tema poderia justificar uma excelente tese de mestrado ou de doutoramento. Há candidatos?
A última questão também ainda não tem resposta. Não entendo. Sinceramente, não entendo. Nas costas das ilhas têm aparecido, em números crescentes, os tubarões-tigres-da-areia (*, *, *) e, nas Formigas, aparecem os tubarões-das-Galápagos. Interessantíssimo! E aguardando por cientistas que aceitem debruçarem-se sobre este extraordinário desafio…